sexta-feira, 29 de maio de 2009
A CRIATIVIDADE NO SEU MELHOR
O BEM E O MAL

Fez-me demasiadas perguntas, às quais eu não sabia responder. Duvidava que alguma vez compreendesse porque a ele e não a outras pessoas quaisquer. Ou talvez compreendesse. Talvez, um dia, eu crescesse. Ser capaz de determinar o motivo pelo qual uns são escolhidos e outros não. Conseguiria perceber todos e mais alguns motivos para que fosse ele e não o outro. Compreendesse finalmente os rodeios do mundo e a verdade da vida.
Foi então que partiu. Partiu sem eu saber o porquê da sua partida.
Todos os segundos, todas as horas, todos os dias da minha vida tinham sido passados ao seu lado. Ele esteve presente em muitas das minhas estreias e em muitos dos meus momentos.
Amava-o como não amava mais ninguém deste mundo. Cresci com ele e agora sou dependente dele. Tornava-se cada vez mais difícil não o ter a meu lado, cada vez mais complicado não saber viver na sua ausência.
Sentia realmente a sua falta. Sentia a falta da sua companhia, dos segredos partilhados, dos medos ultrapassados. Sentia falta do meu maior e melhor amigo.
É das melhores coisas no mundo!
Os melhores anos da nossa vida
São passados com os nossos amigos!
Estes, de quem falo,
São os verdadeiros amigos!
Estão sempre lá…
Em todos os momentos,
Os momentos para sorrir,
E até nos momentos para chorar
Ao longo da vida,
Também nos aparecem
Os falsos amigos!
Mas temos de saber detectá-los.
Somos fortes,
Inteligentes e
Capazes…
O suficiente para ultrapassar,
Tudo o que nos vai acontecendo!
Estes “amigos”
Não merecem
Uma preocupação,
Uma lágrima,
Um sorriso, sequer!
Devemos e temos de aceitar
Cada um como é…
Os defeitos e
As virtudes.
Verdadeiro amigo
É tudo isto!
Aceitam-se,
Apoiam-se,
Compreendem-se,
Gostam-se…
Com tudo isto...
Digo-te, TU, sim, és um verdadeiro AMIGO
Não funcionamos como máquinas, e os momentos também doem, também ferem, também marcam.
Vale a pena enganar a sorte, fintar o obstáculo sem passar por ele, mesmo dando uma volta maior. Nunca parar para não percebermos que nos enganámos no caminho, para não percebermos que estamos perdidos. Sim, corajoso é arriscar, ultrapassar sem medo, ir para onde se quer e não para onde se pode. Sim, corajoso é mudar de rumo sempre que apetece, ir para o mais difícil como se fosse o mais fácil. Sim, corajoso é pensar que quanto mais fundo cairmos, mais alto subiremos. No entanto, não vale a pena ser sempre corajoso. Há que tratar a coragem como um triunfo utilizado num jogo, com um certo de limite de utilizações, para não ser desperdiçada. Usar a coragem sem pensar, faz com que corra mal, que não valha a pena e faz com que a deixemos de ter. E sem ela, as nossas opções ficam condicionadas, restritas, um tanto entregues ao acaso.
Um desvio de olhar, um sorriso ou uma lágrima podem ser exemplos de coragem. Ou então, podem ser restos de emoções, ou resultados de vários ensaios da razão. Não sabemos muito bem onde paira o genuíno, o inevitável. Não sabemos o limite entre expressividade fingida ou a expressividade errada na hora certa, que oferece a graciosidade de um momento puro.
O ser consegue transformar, enganar. Consegue pensar, sentir e decidir com coragem ou sem coragem. Viver entre achados e perdidos, entre elementos confusos, entre sentimentos, emoções e pensamentos retiram o conceito de constante a todas as vidas. Fingir não resulta, esconder pouco serve, fica sempre algo de fora, quase como quem se esconde atrás das cortinas e deixa os pés à vista.
Fingir que somos uma construção pedras, torna-se ridículo, porque as construções tambem se desmoronam.
O facto de termos cinco dedos em cada mão talvez esteja relacionado com o facto de não conseguirmos rodar o mundo apenas com o dedo mindinho, por muito que queiramos mostrar que isso é a nossa lei.
Carolina Marques 10ºF
Desde que sussurraste ao meu ouvido e tocaste a bela música... Uma paixão profunda abateu-se sobre mim.
Então um calor humano aproximou-se. Envolveu-me em passos delicados.
Passo a passo, tudo ganhou forma. Agora algo dança em mim.
Sentimentos expelidos através de movimentos.
Hip-hop ou Jazz, Salsa ou Tango... Individual ou em par. Tudo relativo.
O encontro está entre a pessoa e a música, para o resultado ser um conjunto de passos criativos e apaixonantes.
Um ouvir atento para me encontrar com os tempos.
A Dança é o maior mistério que escondemos dentro de nós. Uns descobrem-na, outros não!
Obrigada por facilitares o caminho até esta arte. Continua a envolver-me com encanto. Somos os poetas do gesto!
Relíquia
Após um abraço apertado e um beijo sentido... algo me perturbou.
Era uma noite normal como as outras. Não fazia anos e não ia partir para lado nenhum. Porquê um abraço e um beijo com sabor a despedida?
Não liguei. Deitei-me. Duas horas depois toca o despertador.
“Que raio, como as oito horas passaram a voar. Nem tive tempo para sonhar!”
Afinal não era o despertador, era a sirene da ambulância.
Soluços e mais soluços, um passo e outro passo... O mais temido aconteceu.
A minha relíquia deitada e caixas de comprimidos à sua volta.
O senhor da bata branca pediu para me retirar da sala.
Uma encruzilhada de porquês envolveram-me a cabeça.
As pessoas crescidas não me respondiam... nem a minha própria consciência.
Porquê a minha relíquia? Porquê? Não me quiseram responder.
Passado que me transtornou o presente.
Não me deram respostas. Estou cheia de dúvidas.
Porquê a minha relíquia? Porquê? Terei sido eu o problema?
Ainda hoje me atormento e continuo nesta solidão.
A porta e a janela continuam fechadas para não ouvir mais sirenes de ambulância e senhores de bata branca.
Se sou eu o problema, deixem-me sozinha.
Um sorriso pode dizer tudo, sem que seja preciso ir dizer ao teu ouvido.

Posso dar-te um sorriso, simplesmente para te dizer que te quero.
Posso dar-te um sorriso, para dizer o quanto me fazes falta.
Posso dar-te um sorriso, em sinal de carinho.
Posso dar-te um sorriso, como te mostro a minha felicidade.
Posso dar-te um sorriso, como um sim.
Posso dar-te um sorriso, como um não.
Posso dar-te um sorriso, como um talvez maroto.
Posso dar-te um sorriso, para te mostrar a minha simplicidade.
Posso dar-te um sorriso, para perceberes que contigo ou sem ti eu sou feliz, porque os que me rodeiam dão-me o que mais preciso.
UM SORISSO.
Posso dar-te um sorriso, porque é o melhor na vida.
Posso dar-te um sorriso, porque quem não sorri não sabe que sorrir é do melhor.
Posso dar um sorriso, porque um simples sorriso serve para começar melhor um novo dia e isso pode mesmo fazer a diferença, às vezes por falta de um sorriso amigo, o nosso dia já não começa como era pensado o que é triste porque nós devemos dar um sorriso à vida, pois a vida não são dois dias são aqueles que quisermos se não sorrirmos agora quando vai ser?!
Não vivo sem mostrar o meu sorriso para dizer o quanto a minha vida tem cor e continua viva, pois tenho aquilo que mais preciso.
Nos melhores, nos piores, seja qual for o momento, mesmo que tente, dou sempre um sorriso à vida.
Foi há algum tempo, talvez sete ou oito anos. Mas lembro-me como se tivesse sido ontem. Às vezes com o decorrer das situações não percebemos que aquele momento pode mudar a nossa vida, pode ficar marcado para sempre ou pelo menos servir de memória quando anos depois olhamos para trás e percebemos que acabou. Temos memórias boas e memórias más. Às vezes queremos recordarmo-nos de alguma coisa e essa coisa foge. Outras vezes não fazemos nada para nos lembrarmos, e sem notarmos a memória segue-nos para todos os lados. Outras vezes queremos esquecer, mas não conseguimos.
Era sábado, todos os sábados vinha jantar a nossa casa. Trazia sempre a sua boa disposição, o seu sorriso. Pegava-me ao colo, fazia-me cócegas até eu não poder mais. Inventava e inventava mil e uma histórias que pareciam tão reais. Insistia comigo para eu fazer a letra bem “desenhadinha” quando eu estava a aprender a escrever. Contava que era um “D. Juan”, que passava por cima de tudo, de todas as dificuldades. Ou melhor, para ele não existiam dificuldades e por isso para mim também não existiam, claro.
Quando sabia que no dia seguinte ia passar o dia com ele, as minhas noites eram lentas, quase tão lentas como a noite antes do dia dos meus anos ou aquelas horas até à meia-noite da noite de Natal.
Quando estava com ele, passava tão rápido. Como quando andamos num carrossel e mal entramos temos de sair. Fazia tudo bem, ou pelo menos parecia fazer. Se lhe pedisse para agarrar no mundo eu tenho a certeza que ele conseguia. Pelo menos conseguiu agarrar em bocadinhos e dar-me. Hoje, é só isso que resta, os bocadinho do mundo que me deu, sem pedir nada em troca. Era capaz de tudo. Os heróis são capazes de tudo, não são?
Naquele dia, naquele sábado, apareceu em minha casa, mais tarde do que o habitual. Mas apareceu e por isso já era sinónimo de festa. Mas não foi isso que aconteceu. Até hoje, não consegui perceber muito bem o que se passou naquela noite. O meu pai e o meu herói foram para lados diferentes, seguiram caminhos opostos, separam-se e cancelaram o laço que os unia. Não vi, porque estava no quarto a fingir que brincava e acho que não tive coragem de sair, mas ouvi um bocadinho da minha família a cair. Ele foi-se embora, não se despediu. Na altura não percebi, mas foram-se passando os dias, os meses, os anos e ele não voltou, não ligou, ele nem se importou. E eu senti tanto a sua falta, tanto. Perguntei tantas vezes, rezei para que voltasse. Mas ninguém me ouviu.
Culpei o meu pai, culpei a minha família porque todos se tinham afastado dele. Tinham deixado que ele fosse, aliás, pior que isso, tinham-no mandado embora.
O tempo foi passando, deixei de sentir saudades, revolta, deixei de precisar da sua presença, deixou de fazer parte da minha vida.
Hoje percebo que a culpa não é do meu pai, não é do resto da minha família. É dele. Porque os heróis verdadeiros não desiludem ou iludem (ainda não descobri) nem faltam e ele faltou. Não ultrapassou o obstáculo que eu precisei que ultrapassasse, ficou para trás, e por isso estes multiplicaram e agora já são tantos aqueles que se atravessam entre nós. Um desses obstáculos é mesmo a memória. Teve a ousadia de trocar os risos, os momentos presentes, a felicidade que eu sentia por isso mesmo, por memórias. Ele não tinha o direito de trocar a presença do meu herói, por uma recordação. Não tinha o direito de abdicar de ser o meu avô.
Branca, quase tão branca como a neve, embora com mais brilho. Tem as bochechas rosadinhas quando a vergonha assim o decide e o maior sorriso do mundo. Ora meio verdes, ora meios cor de avelã, os seus olhos dependem do sol. Transmite a sua beleza, a beleza única que faz com que ninguém se esqueça da sua cara redonda, do seu nariz também redondo, dos seus cabelos lisos castanhos, que lhe alongam a bonita testa quando amarrados e sobretudo da força que deita para fora quando arregala os seus olhos ou quando ri sem parar, fazendo a tal covinha no queixo. As mãos grandes e macias, de quem sabe e toca piano com a alma. A melodia de um corpo, meio de viola, com as suas curvas também meio elegantes. Ela, é assim, difícil de descrever, por ser também difícil de encontrar parecido. Ela, é assim, uma princesa, é assim, a Maria Lopes.
4 de Agosto de 1944
Querida Kitty:
Quando amanheceu, eu ia jurar que o dia que acabara de nascer, iria ser um dia de sol. Iria, mas não foi. As suposições e previsões davam sempre errado, então nestes últimos tempos, o melhor era mesmo esperar para ver o que acontecia. Reduzir-me a minha insignificância de castanheiro, de velho castanheiro. As minhas preces não valem nada, era ridículo pedir um dia de sol, se todos os dias eram cinzentos. Era ridículo prever, sempre que amanhece, dia após dia, um dia diferente, calorento e bonito. Ai que saudades eu tenho da beleza de um sorriso. Um sorriso de um judeu, ariano, preto, branco, amarelado, vermelhusco. Um sorriso, era sempre um sorriso kitty.
Bem, a minha prece e quase certeza, porque as preces só valem se acreditarmos nelas com muita força, para um “hoje” de sol e radiante foi rejeitada. Aliás, tem vindo a ser rejeitada todos os dias, mas hoje para além de rejeitada deve ter sido trocada e baralhada. Aconteceu tudo ao contrário. Mas não culpo ninguém, as preces devem ser tantas: de povos, de vidas, de pessoas que dar conta de todas, deve ser bem complicado.
O dia não tinha chegado a meio e eu já sentira que algo tinha acabado. Também, tudo dura pouco, menos a prisão que quase todos sentem por aqui. Ou melhor, por ali, muito mais longe. Longe de tudo, longe da própria vida.
Ela foi presa. Sim, ela. A judia para quem olhava todos os dias e por quem queria olhar, proteger. Mas não pude, não consigo. Foi o terror, o pânico, a tristeza, o sofrimento. Descobriram-na e levaram- -na. Senti que ia ficar sozinho outra vez. Já me tinha habituado ao rosto pálido e triste da Anne. Agarraram-na, foram tantos os gritos, mas tantos. Quando a noite chegou, desejei não ser um simples e velho castanheiro. Queria ser homem e lutar contra isto. Sou velho, mas percebo as injustiças. Tu sabes, eu tenho garra. Digo-te isto porque sei que não me vais chamar convencido. Mas eu sinto que tinha amor para todos, de todas as raças e espécies. Ai, espera, estou
O peso dos dias, o desejo de fim, a dor dos caminhos enganados. Escolhem viver felizes para sempre e sobrevivem infelizes mais um dia, dizem elas. Mas no fundo, todos sabem que vai ser por mais outro dia, e por mais outro, e por mais outro. Às vezes conseguem abdicar da sobrevivência e optar pela vida, mas ele volta a aparecer, a prometer e a vencer. São corajosas as mulheres que se deixam levar pela inocência, pelo sonho e por um amor. Amam quem as odeia, perdoam quem nunca na vida se vai conseguir perdoar a si próprio. Pelos filhos vivem anos e anos de angústia, de sofrimento físico e psicológico. É preciso muito mais do que a vergonha para aguentar a violência doméstica e lidar com ela como lei de rotina.
O maior sonho torna-se num pesadelo. O príncipe encantado torna-se um monstro. Uma excepção torna-se num acto diário. Um acto de nervosismo ocasional torna-se num acto sistemático. Uma palavra violenta dita num dia, acabar por tornar-se num monólogo de terror, todos os dias. O silêncio, o medo, a vergonha. O sentimento de uma vida perdida, de anos falhados.
Ninguém merece amar a pessoa errada, ninguém merece ser enganado e quando pensa que pode estar perto do céu, a viver aquilo que sempre desejou, a ganhar asas, cair num beco sem saída.
São tantos os testemunhos, tantas as notícias, tantas as palavras ditas em torno deste assunto, tantas as associações, mas nada consegue apagar as marcas deixadas na pele, a amargura deixada no coração e a lágrima que caiu tantas vezes do olho.
Tenho uma admiração inabalável pelas mulheres que caladas vivem nas ruelas do horror, numa vida escura e diferente de todas as outras, mas tão igual, todos os dias. Ninguém tem o direito de roubar a alegria de cada dia, o brilho do olhar, o orgulho em si próprio. A elas roubam-lhes isso tudo. Deixam de ser mulheres. Admiro-as, porque mesmo depois de lhes tirarem a identidade, de serem condenadas todos os dias, conseguem, por exemplo, sorrir para os filhos, dar-lhes todo o amor do mundo e ainda mais algum que a dor tranformou. Admiro a coragem que elas possuem ao acreditar que um dia pode acabar em vez de acabarem com tudo num dia.
As mulheres vítimas de violência doméstica são vencidas, não por serem fracas, mas por serem fortes de mais, porque ninguém sofre como elas sofrem. E alguém que sofra assim, tem muita garra.
Por muito que escreva e tente expressar a minha opinião sobre este assunto, sobre elas, eu não consigo. Não tenho bem a noção, nem eu, nem ninguém que acompanhe de fora, o quão triste e grave, a violência doméstica consegue ser. Enganam-se aqueles que dizem que a vergonha é delas, porque essa, pertence completamente aos que as maltratam. E muito antes de elas serem coitadas, já eles o eram, porque nasceram cobardes.
Devia ser possível conseguir viver um bocadinho de um sonho, sempre. Para sempre.
terça-feira, 26 de maio de 2009
ATENÇÃO
sexta-feira, 22 de maio de 2009
REFLEXÃO SOBRE POESIA
AS FOTOS DA FEIRA!
INFORMAÇÃO
ALGUNS DOS NOSSOS POETAS SÉC. XX

Vitorino Nemésio [1901-1978]
Vitorino Nemésio foi ficcionista, poeta, cronista, ensaísta, biógrafo, historiador da literatura e da cultura, jornalista, investigador, epistológrafo, filólogo e comunicador televisivo, para além de toda a actividade de docência.
Levou a cabo, na sua obra, uma transformação das tendências da Presença (que de certa forma precedeu), que garantiu a eternidade dos seus textos. Fortemente marcado pelas raízes insulares, a vida açoriana e as recordações da sua infância percorrem a obra do escritor, numa espécie de apelo, revelado pela ternura da sua inspiração popular, pela presença das coisas simples e das gentes, e pela profunda humanidade face à existência e ao sofrimento da vida humana.

Sophia de Mello Breyner Andresen [1919-2004]
Está presente em Sophia também uma ideia da poesia como valor transformador fundamental. A sua produção corresponde a ciclos específicos, com a culminação da actividade da escrita durante a noite: “não consigo escrever de manhã, (...) preciso daquela concentração especial que se vai criando pela noite fora.”. A vivência nocturna da autora é sublinhada em vários poemas (“Noite”, “O luar”, “O jardim e a noite”, ”Noite de Abril”, “Ó noite”). Aceitava a noção de poeta inspirado, afirmava que a sua poesia lhe acontecia, como a Fernando Pessoa: “Fernando Pessoa dizia: «Aconteceu-me um poema». A minha maneira de escrever fundamental é muito próxima deste «acontecer». (...) Encontrei a poesia antes de saber que havia literatura. Pensava mesmo que os poemas não eram escritos por ninguém, que existiam em si mesmos, por si mesmos, que eram como que um elemento do natural, que estavam suspensos imanentes (...). É difícil descrever o fazer de um poema. Há sempre uma parte que não consigo distinguir, uma parte que se passa na zona onde eu não vejo.”[8]. A sua própria vida e as suas próprias lembranças são uma inspiração para a Autora, pois, como refere Dulce Maria Quintela (1981:112), ela “fala de si, através da sua poesia”.

Ruy Belo [1933-1978]
Tendo sido, na sua passagem pela imprensa, director literário da Editorial Aster e chefe de redacção da revista Rumo, os seus primeiros livros de poesia foram Aquele Grande Rio Eufrates (1961) e O Problema da Habitação (1962). Às colectâneas de ensaios Poesia Nova (1961) e Na Senda da Poesia (1969), seguiram-se obras cuja temática se prende ao religioso e ao metafísico, sob a forma de interrogações acerca da existência. É o caso de Boca Bilingue (1966), Homem de Palavras(s) (1969), País Possível (1973, antologia), Transporte no Tempo (1973), A Margem da Alegria (1974), Toda a Terra (1976) e Despeço-me da Terra da Alegria (1977). O versilibrismo dos seus poemas conjuga-se com um domínio das técnicas poéticas tradicionais. A sua obra, organizada em três volumes sob o título Obra Poética de Ruy Belo, em 1981, foi, entretanto, alvo de revisitação crítica, sendo considerada uma das obras cimeiras, apesar da brevidade da vida do poeta, da poesia portuguesa contemporânea.

António Gedeão [1906-1977]
Foi um professor de Físico-Química do liceu , pedagogo, investigador de História da ciência em Portugal, divulgador da ciência e poeta, sob o pseudónimo de António Gedeão.

Natália Correia [1923-1993]
Notabilizada através de diversas vertentes da escrita, já que foi poeta, dramaturga, romancista, ensaísta, tradutora, jornalista, guionista e editora, tornou-se conhecida na imprensa escrita e, sobretudo, na televisão, com o programa Mátria, onde advogou uma forma especial de feminismo – afastado do conceito politicamente correcto do movimento — o matricismo —, identificador da mulher como arquétipo da liberdade erótica e passional e fonte matricial da humanidade; mais tarde, à noção de Pátria e de Mátria acrescenta a de Frátria.
Dotada de invulgar talento oratório e grande coragem combativa, tomou parte activa nos movimentos de oposição ao Estado Novo, tendo participado no MUD (Movimento de Unidade Democrática, 1945), no apoio às candidaturas para a Presidência da República do general Norton de Matos (1949) e de Humberto Delgado (1958) e na CEUD (Comissão Eleitoral de Unidade Democrática, 1969). Foi condenada a três anos de prisão, com pena suspensa, pela publicação da Antologia da Poesia Portuguesa Erótica e Satírica, considerada ofensiva dos costumes, (1966) e processada pela responsabilidade editorial das Novas Cartas Portuguesas de Maria Isabel Barreno, Maria Velho da Costa e Maria Teresa Horta. Foi responsável pela coordenação da Editora Arcádia, uma das grandes editoras portuguesas do tempo.

Miguel Torga [1907-1995]
A obra de Torga tem um carácter humanista: criado nas serras trasmontanas, entre os trabalhadores rurais, assistindo aos ciclos de perpetuação da Natureza, Torga aprendeu o valor de cada homem, como criador e propagador da vida e da Natureza: sem o homem, não haveria searas, não haveria vinhas, não haveria toda a paisagem duriense, feita de socalcos nas rochas, obra magnífica de muitas gerações de trabalho humano. Ora, estes homens e as suas obras levam Torga a revoltar-se contra a Divindade Transcendente a favor da imanência: para ele, só a humanidade seria digna de louvores, de cânticos, de admiração: (hinos aos deuses, não/os homens é que merecem/que se lhes cante a virtude/bichos que cavam no chão/actuam como parecem/sem um disfarce que os mude).
Para Miguel Torga, nenhum deus é digno de louvor: na sua condição omnisciente é-lhe muito fácil ser virtuoso, e enquanto ser sobrenatural não se lhe opõe qualquer dificuldade para fazer a Natureza - mas o homem, limitado, finito, condicionado, exposto à doença, à miséria, à desgraça e à morte é também capaz de criar, e é sobretudo capaz de se impor à Natureza, como os trabalhadores rurais trasmontanos impuseram a sua vontade de semear a terra aos penedos bravios das serras. E é essa capacidade de moldar o meio, de verdadeiramente fazer a Natureza mau grado todas as limitações de bicho, de ser humano mortal que, ao ver de Torga fazem do homem único ser digno de adoração.
Considerado por muitos como um avarento de trato difícil e carácter duro, foge dos meios das elites pedantes, mas dá consultas médicas gratuitas a gente pobre e é referido pelo povo como um homem de bom coração e de boa conversa.

Mário Cesarinny [1923-2006]
Mário Cesariny adopta uma atitude estética de constante experimentação nas suas obras e pratica uma técnica de escrita e de (des)pintura amplamente divulgada entre os surrealistas. Introduz também a técnica designada “cadáver esquisito”, que consiste na construção de uma obra por três ou quatro pessoas, num trabalho em cadeia criativa em que cada um dá continuidade, em tempo real, à criatividade do anterior, conhecendo apenas parte do que este fez.

Manuel Alegre [n.1936]
Estudou Direito na Universidade de Coimbra. Desde muito cedo demonstrou os seu ideais políticos. Cumpriu o serviço militar na guerra colonial em Angola. Nessa altura, foi preso pela polícia política (PIDE) por se revoltar contra a guerra. Paralelamente à carreira política, produziu larga obra literária que lhe conferiu notoriedade dentro do país, destacando-se sobretudo a sua obra poética. Nunca chegou a concluir a licenciatura em Direito.

Herberto Helder [n. 1930]
A sua escrita começou por se situar no âmbito de um surrealismo tardio. Escreveu "Os Passos em Volta", um livro que através de vários contos, sugere as viagens deambulatórias de uma personagem por entre cidades e quotidianos, colocando ao mesmo tempo incertezas acerca da identidade própria de cada ser humano (ficção); "Photomaton e Vox", é uma colectânea de ensaios e textos e também de vários poemas. "Poesia Toda" é o título de uma antologia pessoal dos seus livros de poesia que tem sido depurada ao longo dos anos. Na edição de 2004 foram retiradas da recolha suas traduções. Alguns dos seus livros desapareceram das mais recentes edições da Poesia Toda, rebatizada Ofício Cantante, nomeadamente Vocação Animal e Cobra.--T-proenca (discussão) 20h33min de 15 de fevereiro de 2009 (UTC)

Fiama Hasse Pais Brandão [1938-2007]

Eugénio de Andrade [1923-2005]
Estreou-se em 1940 com a obra Narciso, torna-se mais conhecido em 1942 com o livro de versos Adolescente. A sua consagração acontece em 1948, com a publicação de As mãos e os frutos, que mereceu os aplausos de críticos como Jorge de Sena ou Vitorino Nemésio. A obra poética de Eugénio de Andrade é essencialmente lírica, considerada por José Saramago como uma poesia do corpo a que se chega mediante uma depuração contínua.

Ary dos Santos [1937-1984]
GUIÃO PARA ANÁLISE DE TEXTOS POÉTICOS
- VIDA e OBRA do POETA SELECCIONADO;
- LINHAS ORIENTADORAS DA SUA POÉTICA;
- ANÁLISE DE UM POEMA POR CADA ELEMENTO DO GRUPO (seguindo a proposta que se apresenta):
1. ESTRUTURA EXTERNA
- Número de estrofes
- Número de versos por estrofe (designação específica)
- Esquema rimático
- Rima / Tipos de Rima
- Métrica (dominante)
2. ESTRUTURA INTERNA
- Identificação do Tema / Assunto
- Divisão do poema em partes lógicas, tendo em conta a organização lógica das ideias
- Resumo de cada uma das partes
3.ASPECTOS ESTILÍSTICOS
- Linguagem (objectiva, subjectiva...)
- Discurso (1ª, 2ª e 3ª pessoas; narrativo, descritivo, reflexivo...)
- Recursos estilísticos mais significativos e respectiva expressividade
4. OUTROS ASPECTOS
- Opinião fundamentada sobre o autor, sobre o poema...
quinta-feira, 21 de maio de 2009
QUESTIONÁRIO
http://www.malhatlantica.pt/lpo/gracaflorbela/textopoetico.htm
POESIA DE SOPHIA
Se todo o ser ao vento abandonamos
E sem medo nem dó nos destruímos,
Se morremos em tudo o que sentimos
E podemos cantar, é porque estamos
Nus em sangue, embalando a própria dor
Em frente às madrugadas do amor.
Quando a manhã brilhar refloriremos
E a alma possuirá esse esplendor
Prometido nas formas que perdemos.
INFORMAÇÃO CULTURAL
Marco D'Almeida recita hoje poesia no Frágil
por RITA BRAVO
O protagonista da série de época Equador (TVI) vai recitar poesia de António Gancho, poeta alentejano falecido em 2006, com 66 anos, acompanhado por Bpm&Noyze.
O actor Marco D'Almeida vai estar hoje na discoteca Frágil (Bairro Alto, Lisboa) a recitar poesia de António Gancho, poeta alentejano falecido em 2006, com 66 anos, acompanhado por Bpm&Noyze, numa sessão intitulada "Os intelectuais saben muy bem zurrar".
O protagonista da série de época Equador (TVI) vai ler a poesia do também apelidado "poeta nocturno
POESIA

POEMA
Senti o meu mundo a estremecer
De ti, bastou-me um olhar
E subitamente, o perecer
Tombaste-me pálida e apática
No chão sujo, escuro e frio
Abandonaste-me a morrer
Caminhaste sem olhar para trás
Roubaste-me, sem saber, meu brio
Agora o medo, a rejeição
O tormento, a solidão
E agora sem ti,
Só me resta chorar,
Chorarei até mais não.
Bastou-me uma palavra
um gesto apenas, o teu olhar
E pela última vez avistar,
O teu sorriso, que resplandece
Tão luminoso que amanhece,
Que é mais profundo que o próprio mar
Pois tu és Sol, és a manhã
És aurora e pôr-do-sol
Tu eras tudo,
Tu foste tudo
Caminha comigo,
Não me deixes sozinha.
Bárbara Ferreira 10ºF
terça-feira, 19 de maio de 2009
HISTÓRIAS, TEXTOS, POEMAS...
Não é que ocupe os meus pensamentos com as histórias das escolas por onde passei. Às vezes, quanto menos lembro, melhor. Mas isto é só para verem como aquela escola era diferente. Eu queria ler-lhes um poema, mas não tinham um livro, eu queria pô-los a ler um poema, mas não tinham um livro. Nem um computador como havia nas outras. Nada.
Então eu, pacientemente, escrevia aos pais todas as semanas para lhes dizer que os seus filhos não tinham material de trabalho, e sem livros como podia ensinar?
Dos pais nada. O silêncio completo.
E lá vinha outro mês e outro e outro e nada.
Eu já não sabia que fazer, que dizer. Eles sabiam tudo de cor, mas não faziam ideia o que era um poema, o que era ler.
Ainda comprei dois do meu bolso, mas 22 cabeças sobre dois livros é difícil.
Até que um dia, surpreendentemente, o Miguel se levantou, ergueu o dedo e pediu para falar. A sua voz soava de dentro, o olhar atento daqueles que o ouviam não deixava escapar qualquer ruído, qualquer movimento. Só eu esboçava felicidade. O Miguel recitava os seus próprios poemas de fio a pavio, sem enganos, sem falhas. Os colegas ouviam, entendiam e queriam mais e mais.
Acho que nem ouvi bem o que ele disse, mas foi assim que aconteceu, foi assim que passou a acontecer. O Miguel tinha uma capacidade diferente de reter as palavras, de brincar com as palavras, tinha um dom especial para as transmitir.
Hoje, recordo ainda aqueles dias que me levaram quase a desistir de fazer o que amo na vida: ensinar.
COMO COMEÇAR UM TEXTO?
terça-feira, 12 de maio de 2009
PENSANDO À MODA DE CAMÕES...
Sabia desde cedo que o meu destino seria apenas o meu mundo, isolado de todos os outros, com o valor de frases que se tornavam na minha lei, na minha companhia.
E é por o meu mundo ser tão só que muitas vezes tenho dificuldade em reconhecer no Homem a sua Humanidade.
Dias e noites sozinho, a olhar para as mesmas paredes, para o mesmo espaço que deposita em mim o peso dos dias e sobretudo o peso da solidão quando a lua se torna visível pela mesma janela de sempre.
E entre estas quatro paredes, um silêncio perturbador que traz lembranças de memórias vividas e escondidas por entre mares e oceanos, por muito que não queira, acabam por dar à costa.
A mão pesa-me sempre que tento utilizar a minha velha pena como forma de transformar esta saudade e solidão da vida em sentimentos perceptíveis apenas nas palavras. Talvez seja esse o facto que traduz o atraso da minha felicidade ainda por chegar. Ela deve estar escondida num ponto final, algures, numa palavra solta menos triste.
MUDAM-SE OS TEMPOS...
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.
Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem, se algum houve, as saudades.
O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.
E, afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto:
Que não se muda já como soía.
TEMA
O tema deste soneto é a mudança. Todas as coisas estão em constante mutação, mas há dois aspectos que perturbam o sujeito dum modo especial:
1 – A diferença existente entre a mudança operada na Natureza, em sentido positivo e o sentido negativo da transformação que se realiza no sujeito;
2 – O facto de a própria mudança mudar, deixando o sujeito também à mercê dos seus caprichos.
ESTRUTURA INTERNA
Estamos perante um soneto perfeito, uma vez que o seu conteúdo ideológico se distribui pelas quatro estrofes, do seguinte modo:
1ª quadra – Apresentação da ideia a desenvolver: a mudança;
2ª quadra – Desenvolvimento da ideia apresentada;
1º terceto – Confirmação, em que se concretiza essa mesma ideia, pela referência às mudanças que se operam na Natureza e no próprio sujeito, e que já vimos serem de sentido oposto;
2º terceto – Conclusão, em que se faz a síntese do conteúdo do soneto: a própria mudança não se muda já como costumava.
UNIDADE FORMA / CONTEÚDO
Este soneto constitui uma reflexão sobre a mudança e todo o discurso se organiza no sentido de reiterar essa ideia:
a) Através da repetição de palavras da família do verbo mudar: “mudam-se”, “muda-se”, “se muda”…
b) Através de substantivos e adjectivos: “novas”, “novidades”, “diferentes”, “converte”…
c) Através de advérbios e expressões adverbiais que definem a continuidade e a irreversibilidade da mudança: “sempre”, “continuamente”, “cada dia”, “já”…
LIVROS, SITES WEB; REVISTAS; JORNAIS LITERÁRIOS E MAIS LIVROS
Por meio da leitura os alunos desenvolvem a iniciativa, cooperação, imaginação e criatividade.
Assim, todos puderam privar quotidianamente com livros literários envolventes e escolhidos pelos próprios alunos.
Proponho-vos algumas leituras de livros, revistas, jornais, sites web...
PORTAL DA LITERATURA: http://www.portaldaliteratura.com/livros.php?livro=353
LITERATURA PORTUGUESA EM NOTÍCIA: http://litport.blogspot.com/
JORNAL DE LETRAS: http://aeiou.visaojunior.visao.pt/default.asp?CpContentId=334670
LIVROS À VOLTA DO MUNDO: http://livrosavoltadomundo.blogs.sapo.pt/58817.html
- O Caçador de Pipas (2003) é o primeiro romance do afegão Khaled Hosseini e o primeiro romance em inglês escrito por um afegão. Hosseini, que actualmente mora na Califórnia, conta uma história mista entre ficção e memórias, oportuna para a época pós 11 de setembro. O livro, que seria uma perfeita tragédia, não fosse o trabalho para se obter um final minimamente feliz, é um retrato de um tempo onde não há heróis, onde o preconceito e a intolerância abafam qualquer forma de humanismo. Apesar de algumas falhas de roteiro, digamos assim, o livro é de fácil leitura e descreve bem os personagens, os cenários e as relações, sendo um interessante retrato de um lugar e um tempo.
Entre os livros contemporâneos que li nos últimos anos, um deles em específico, pode ser considerado um clássico literário desde o seu lançamento, feito com muito alarde na época: O Nome da Rosa (1984), do italiano Umberto Eco. Livro denso e pesado, li-o anos depois de ter visto o respectivo filme.O livro é brilhante, absolutamente perfeito, arrasta-nos para uma trama metalingüística na idade média dos inquisidores. Uma obra difícil de ignorar, principalmente quando se analisa a questão do poder sobre a informação.
A FERMOSURA...
e a sombra dos verdes castanheiros,
o manso caminhar destes ribeiros,
donde toda a tristeza se desterra;
o rouco som do mar, a estranha terra,
o esconder do sol pelos outeiros,
o recolher dos gados derradeiros,
das nuvens pelo ar a branda guerra;
enfim, tudo o que a rara natureza
com tanta variedade nos of´rece,
me está(se não te vejo) magoando.
Sem ti, tudo me enjoa e me aborrece;
sem ti, perpetuamente estou passando,
nas mores alegrias, mor tristeza.
TEMA
O tema deste soneto é a necessidade da presença da mulher amada para que a felicidade do sujeito seja possível (“Sem ti, tudo me enoja e me aborrece”).
ESTRUTURA INTERNA
O soneto divide-se em duas partes lógicas, desempenhando a palavra “enfim” a mudança:
1ª parte – duas quadras – descreve-se uma natureza harmoniosa, propícia ao amor;
2ª parte – dois tercetos – refere a irrelevância da beleza natural sem a mulher amada.
A 1ª parte do texto é constituída por uma descrição que, basicamente, se estrutura numa enumeração de elementos que constituem a paisagem e que são qualificados ora por adjectivos ora por substantivos ou orações relativas.
A 2ª parte constitui uma síntese, que se conclui ser “rara” e dotada de grande “variedade”. Mas, para além dessa síntese, o poeta introduz, nesta parte, um novo elemento – o “tu” -, que se vem juntar ao Eu – Natureza até então dominante. E a presença deste terceiro elemento assume um carácter decisivo na visão da paisagem: na ausência da amada (o “tu”) tudo o “enoja” e “aborrece” e “perpetuamente” passará “mores alegrias, mor tristeza”.
Enquanto a descrição da 1ª parte tendia para a objectividade (exterioridade / 3ª pessoa), na 2ª parte, com a introdução das 1ª e 2ª pessoas do singular (instituindo-se uma relação eu-tu-Natureza), o texto assume certo dramatismo e uma grande subjectividade.
UNIDADE FORMA / CONTEÚDO
O dramatismo e a subjectividade da 2ª parte devem a sua intensidade à utilização de alguns recursos estilísticos:
a) Anáfora - “Sem ti… Sem ti”
b) Antítese - “Nas mores alegrias, mor tristeza”
AQUELA TRISTE E LEDA MADRUGADA
Cheia toda de mágoa e de piedade,
Enquanto houver no mundo saudade
Quero que seja sempre celebrada.
Ela só quando, amena e marchetada,
Saía, dando ao mundo claridade,
Viu apartar-se de ua outra vontade,
Que nunca poderá ver-se apartada.
Ela só viu as lágrimas em fio,
Que duns e doutros olhos derivadas,
Se acrescentaram em grande e largo rio.
Ela viu as palavras magoadas,
Que puderam tornar o fogo frio,
E dar descanso às almas condenadas.
TEMA
O tema deste conhecido soneto é a separação (despedida) dos amantes numa madrugada simultaneamente “triste e leda”. Triste porque testemunha da grande dor que os domina, portanto, subjectivamente triste; e alegre, porque se trata do romper duma aurora “amena marchetada” de um dia radioso, portanto objectivamente, alegre.
ESTRUTURA INTERNA
O soneto divide-se em duas partes lógicas:
1ª parte – 1ª quadra – funciona como uma introdução, em que o poeta manifesta a vontade (“quero”) de que “aquela triste e leda madrugada (…) seja sempre celebrada”;
2ª parte – 2ª quadra e os dois tercetos – justifica-se a necessidade da celebração dessa madrugada, correspondendo cada uma dessas estrofes a um momento da justificação.
Cada um desses momentos é marcado, não só pela divisão estrófica, mas também pela repetição do pronome pessoal “Ela”, referido à madrugada, personagem principal e única testemunha (“viu”) daquela separação.
A 1ª parte é mais descritiva, passa-se no presente (“quero”) e o sujeito projecta os seus desejos no futuro.
A 2ª parte é mais narrativa, evoca um acontecimento, e daí a utilização dos pretéritos perfeito (“viu” (três vezes); “acrescentaram”) e imperfeito do indicativo (“saía).
UNIDADE FORMA / CONTEÚDO
O elemento madrugada assegura a unidade do poema e funciona como personagem principal. Assim, são-lhe atribuídas características e acções animizadoras: triste, leda, cheia de mágoa e de piedade, amena…
O carácter desta separação pode ver-se através de:
a) Hipérbole - as lágrimas “que s’acrescentaram em grande e largo rio”
b) Antítese - as palavras magoadas “que puderam tornar o fogo frio”
segunda-feira, 11 de maio de 2009
ONDADOS FIOS DE OURO...
Que agora da mão bela recolhidos,
Agora sobre as rosas estendidos
Fazeis que sua graça se acrescente;
Olhos, que vos moveis tão docemente,
Em mil divinos raios encendidos,
Se de cá me levais alma e sentidos,
Que fora, se de vós não fora ausente?
Honesto riso, que entre a mor fineza
De perlas e corais nasce e parece,
Se na alma em doces ecos não o ouvisse!
Se imaginando só tanta beleza,
De si, em nova glória, a alma se esquece,
Que será quando a vir? Ah! quem a visse!
TEMA
Neste soneto, o sujeito imagina e exalta a beleza da amada ausente, cujo retrato reconstitui pela memória (influência platónica da teoria da reminiscência), e, no último terceto, exprime grande desejo de a ver, através da interrogação retórica, da interjeição (“Ah!”) e da exclamação. Revela, sobretudo, influência petrarquista na idealização da mulher e na exaltação das suas qualidades físicas (os cabelos, os olhos, o rosto, os dentes, os lábios) e, também, das suas qualidades psicológicas ou morais (a doçura, a graça, a honestidade).
ESTRUTURA INTERNA
O soneto divide-se em duas partes lógicas:
1ª parte – primeiros onze versos – caracterizam e exaltam a beleza da amada, concentrada nos cabelos, nos olhos e no riso;
2ª parte – último terceto – a oração condicional, o advérbio “tanta”, a interrogação retórica e a exclamação fnal contribuem para dar feição hiperbolizante aos encantos da amada e justificam o forte desejo de a ver.
UNIDADE FORMA / CONTEÚDO
A caracterização da amada e a exaltação da sua beleza são conseguidas através dos seguintes recursos estilísticos:
a) Metáfora - “Ondados fios de ouro reluzentes” (cabelos louros ondeados e luzidios),
“as rosas” (as faces cor-de-rosa),
“em mil divinos raios encendidos” (intensamente brilhantes),
“perlas e corais” (dentes e lábios),
“a alma se esquece” (se extasia).
b) Personificação - dos cabelos e dos olhos, a quem o sujeito se dirige.
c) Interrogação Retórica - 8º verso e no último.
d) Exclamação e Interjeição - 11º e 14º versos.
e) Adjectivação expressiva - “ondados”, “reluzente”, “honesto”, “doces”.
UM MOVER DE OLHOS...
Sem ver de quê; um riso brando e honesto,
Quase forçado; um doce e humilde gesto,
De qualquer alegria duvidoso;
Um despejo quieto e vergonhoso;
Um repouso gravíssimo e modesto;
Üa pura bondade, manifesto
Indício da alma, limpo e gracioso;
Um escolhido ousar; úa brandura;
Um medo sem ter culpa; um ar sereno;
Um longo e obediente sofrimento
Esta foi a celeste fermosura
Da minha Circe, e o mágico veneno
Que pôde transformar meu pensamento.
TEMA
O tema deste soneto é a beleza da amada e o fascínio por ela exercido no sujeito. Trata-se de um retrato mais espiritual do que físico, que se conclui com uma referência à transformação do seu pensamento provocada pela sua formosura, que funcionaria como um “mágico veneno”. Esta escassa referência a características físicas e a predominância das qualidades morais remetem-nos para a ideologia platónica. Todavia, é sobretudo nítida a influência petrarquista no ideal de beleza feminina, e nas qualidades morais atribuídas à mulher, expressas por uma adjectivação abundante e por substantivos abstractos. Observa-se, ainda, que, na esteira de Petrarca, as qualidades morais predominam sobre as físicas e o fascínio resulta, portanto, da beleza espiritual.
ESTRUTURA INTERNA
O soneto divide-se em três partes lógicas:
1ª parte – duas quadras e 1º terceto – enumeração dos atributos físicos e morais da amada.
2ª parte – versos 12 e 13 – sintetizam esses atributos “Esta foi a celeste fermosura (…) e o mágico veneno”
3ª parte – último verso – confessa-se o fascínio sentido pelo sujeito “…pôde transformar meu pensamento”
UNIDADE FORMA / CONTEÚDO
Ao carácter descritivo do poema, constituído por uma enumeração de qualidades e seus efeitos no sujeito, determina a utilização de certos recursos estilísticos:
a) Anáfora – repetição do artigo indefinido em início de verso, e que marca a passagem de
b) Discurso Valorativo - traduz o juízo de valor que o sujeito faz da amada, e assenta, sobretudo, em adjectivos e expressões que contêm uma apreciação subjectiva das suas qualidades;
c) Abundância de adjectivos e substantivos abstractos e a quase inexistência de verbos;
d) Substantivação de verbos: “um mover de olhos”, “um encolhido ousar”
e) Artigo Indefinido - sugere proximidade afectiva entre o sujeito e a amada;
f) Antítese - “celeste fermosura” / “mágico veneno”, “um mover de olhos(…)” / “sem ver de quê”
g) Enumeração assindética - acumulação de segmentos de frase, separados por ponto e vírgula, e sem recorrer à copulativa “e”;
h) Metáfora - “mágico veneno”, “a minha Circe”.